Ainda menino de escola, fui com os meus pais viver para o Botaréu, junto à Capela da Misericórdia e, depressa o convívio com as gentes que, viviam do rio Tejo, se estabeleceu. Nos seus barcos e nas suas casas, comi das suas ementas, como também na rua e no cais da vala real, brinquei com os seus filhos.
Aquele convívio, foi para mim uma oportunidade de ouvir aos Fragateiros e Varinos/ Cagaréus, histórias das suas comunidades.
Há muitos séculos, que o rio Tejo as conhecem, os pescadores Cagaréus, desceram lá muito de cima, do norte e em Lisboa, até existe junto à ribeira, um dos seus bairros - A Mouraria, que estava povoado desta gente quando do terramoto de 1577.
Aqueles que vieram viver para Salvaterra de Magos, eram dos mesmos sítios; Aveiro. Ovar, Estarreja e Murtosa. Há muitas gerações que andavam rio abaixo, rio acima, na faina do peixe, especialmente no inverno, para depois o enviarem, em cestos de verga, para muitos lados, inclusivé o Porto.
Primeiramente era em carros puxados a animais, até que o advento do caminho-de-ferro, em Portugal, lhes facilitou mais a vida, através da estação de Muge.
Antes deles, já os Fragateiros eram "donos" do cais da vala, pois movimentavam nas suas Faluas e Fragatas, embarcações à vela, as mercadorias, com destino a Lisboa, e outros portos, rio acima, quando este era então navegável, lá para os lados de Abrantes.
Quanto aos Avieiros, uma outra comunidade, de pescadores vindos de Vieira de Leiria, cujos registos no Tejo, se notou mais tarde e, o Escaroupim, foi um sítio de aporto, como muitos outros ao longo do rio.
O Pinhal do Escaroupim, existe do tempo de D. Dinis, o comércio e a indústria, especialmente a naval, requeriam muita madeira e, Lisboa ficava a meia centena de km de Salvaterra e, com o curso das marés do rio Tejo, faziam deslizar nas águas grandes quantidades de toros.
A história da vala real de Salvaterra de Magos, encontra-se registada em muita documentação. Iniciou-se como Sangria, pois foi aberta, por causa das águas que se acumulavam em terrenos pantanosos nos baixios de Magos e, das nascentes da bacia da Ameixoeira, um pouco mais acima, corriam para Juzante até se juntarem ao Tejo na Boca da Goiva. As marés do rio, traziam e levavam peixes, como o barbo e fataça que, eram abundantes nas águas da vala, ainda no dobrar do século passado.
As histórias vivas, deste pequeno curso de água, que passa no sítio da ponte da madeira, são aquelas guardadas na memória por quem lá trabalhou, ou por quem com eles conviveu.
Muitas e variadas "historietas" são aventadas todos os dias, mesmo para a sua ponte de pedra, por quem visita por uns momentos aquele local, tudo sabem ou imaginam, sobre o seu passado mesmo recente. É de ouvi-los !!!!
Vivi a escassos metros do barracão onde via o mestre calafate, António Joaquim Henrique Miranda, conhecido pelo "Perguiça", construía as bateiras. Uma história dele se contava, um dia, construíu uma tão grande, quando pronta não saíu à porta, porque bebia bem, dizia-se: Talvez visse duas pequenas !
Eu, que corri corda, e vi fazê-la, tenho dificuldade em informar que isso aconteceu!
* Um casal, de Benavente, com dois filhos ainda pequenos, vinha algumas vezes durante o ano, até junto dos fragateiros venderem corda nova para ser usada, nos barcos.
Depois do negócio feito, para a quantidade de metros necessários, era iniciada a sua "feitura". Umas peças de madeira com pequenos ferros, eram colocadas junto ao muro grande, vedação da propriedade do conde, ao pé do celeiro, desde a estrada até à borda da vala, onde agora existem umas construções em madeira, com espaços calculados para suportarem o peso.
A mulher, passava o dia, movimentando uma manivela de ferro, fazendo girar uns carretos (sentido dos ponteiros de relógio), o homem e os filhos, iam metendo, o cordel de sisal, de muitos novelos. Depois de bem enrolados, davam azo a muitos metros de um novo cabo, alguns muito grossos, ao fim de alguns dias de trabalho.
De seguida, o velho Cadório, antigo pescador, "arregimentava" um grupo de rapazes (onde eu, me incluía), para passar a corda, a troca de alguns tostões para os rabuçados que depois compravamos na taberna do Camilo.
Os vários metros (bem pesados), dos novos cabos eram cozidos, num panelão, ao lume durante várias horas, com água de tinta de carrasca de pinho, feita previamente.
Depois da "cosedura", sempre ao cair da tarde (para passar a noite ao relento), os metros do cabo, eram "corridos" pelos rapazes entrelaçados entre os muitos choupos pequenos, que existiam, no terreno de trás-de-monturos (no local onde agora se faz a feira anual e algumas festividades da terra) e, ali ficavam estendidos (apertados), até secarem. ......
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Nota: Extraído do Livro Nº 11 "Cagaréus,Fragateiros e Avieiros - Gente que veio do mar" da
Colecção Recordar, Também é Reconstruir! * Foto, ao fundo o muro em direcção ao cais da vala
* Ver a colecção Vídeos: Patrimonio Monumental cultural de Salvaterra de Magos
JOSE GAMEIRO
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