A PEDRA DE LIOZ, NA FEITURA DE RODAS DE MADEIRA/
ou local de recolha dos enjeitados!
A II guerra Mundial, tinha acabado em Junho de 1945, naquele tempo ainda havia duas pedras redondas de lioz, com buraco no meio, onde assentava o meão da roda raiada de madeira dos carros de madeira.
Em frente à Trav. do Secretário, havia um grande tanque que recebia água da fonte de Santo António, era aí que as manadas de gado “matavam a sede” no seu transito a caminho do campo, ou no regresso na pernoita nos currais, ao lado no chão uma grande pedra era usada pelos ferreiros da vila, na colocação de ferro nas rodas de madeira, depois de ficarem em brasa numa grande fogueira, a água servia para arrefecer o ferro.
No largo da fonte do Arneiro, construção de 1711, recebia água através de uma construção subterrânea, com o tamanho de mais de meia légua, desde as terras do Convento de Jericó
A pedra ali existente, conservava também outras razões, que o povo por volta de 1938, ainda lhe chamava a pedra dos enjeitados!
Na época, na terra já ninguém se lembrava do homem que foi mestre de oficio de forjar o ferro, conhecido por Zé Fungão, que juntava o seu nome, a um outro afamado ferreiro, António Henriques Alexandre, aquele que no trabalho de forja e bigorna, um dia moldou o ferro e os tubos que, depois foram cromados, em Santarém, e ornamentaram o primeiro pronto-socorro dos bombeiros da vila, e ambos tiveram oficina para os lados da Azinhaga.
O mestre; Manuel Amaro, teve oficina, perto da capela real, mas não foi a sua arte, que o deixou lembrado. O seu sobrinho; José Amaro, também esteve aí para aprender e fazer carreira naquela profissão, mas muitos anos depois já licenciado em medicina, acabou por escrever um conto verdadeiro, “O Último Dia do Lobo em Salvaterra”, onde recorda que ele o tio, foram personagens centrais do acontecimento.
O João Augusto Borrego, mestre que, teve oficina, na EN 118-2, e na antiga casa a porta e janela, já consumidas pela “velhice” ainda se podem ver na madeira, algumas marcas de ferros, de antigos lavradores de Salvaterra.
O mestre-carpinteiro de carros de madeira, António Morais, tinha local de ganha-pão, ao lado do mestre Amaro, era o artífice proferido, pela arte que mostrava ao fazer os rodados dos carros de bois e carroças.
No dia aprazado para a “ferra” das rodas nas grandes fogueiras feitas naqueles locais com água, juntava-se todo o pessoal das oficinas, onde num trabalho de entreajuda, os malhadores; Abel da Silva e José Ferreira tinham trabalho de apreço!
A pedra, que serviu ali junto tanque de água ( destruído em parte, em 1985), esteve uma boa vintena de anos, encostada a um dos três eucaliptos naquele espaço – um dia desapareceu!
A roda de pedra, junto à fonte do séc. XVIII, era ali que, algumas crianças, após o nascimento eram abandonadas. Manhã cedo, ao clarear o dia, a população, especialmente as mulheres e moças, iam buscar água nos seus potes de barro, para beberem e afazeres domésticos.
Encontravam ali crianças abandonadas – eram enjeitadas!
Recolhidas e entregues à Misericórdia local, onde ficavam algum tempo, após vigilância municipal, não sendo resgatadas por familiares, eram encaminhadas para a Misericórdia de Lisboa ou Casa Pia, onde eram criadas e educadas – ficando registado o seu nascimento, como “expostas!...” em lugar incerto na freguesia e vila de Salvaterra de Magos.
Por volta de 1985, na presidência da câmara municipal do executivo; António Moreira, o seu vereador; Joaquim Mário Antão, tomou em mãos obras de conservação naquela fonte, não deixando de simbolizar o local, colocando ali uma grande roda de cimento, lembrando a pedra de lioz, que há muito dali tinha sido retirada.
*José Gameiro
Fotos: @ do autor - 1990
-Eh home…, já vens na mêma! – uma tarde e noite dentro na taberna, chegas a casa a toldar da cabeça, e com o bandulho cheio de vinho, at`eimas sempre nisso!
-Aqui tô eu, moidinha de trabalho, à espera do dinheiro da jorna p`ra ir à loja, comprar comida p`rás crianças, e t`ou a aver que ainda ei-de ser velhinha, e continuar agarrada à saia da minha mãe!..
Era o ralhete, que se ouvia, em casa de alguns jornaleiros rurais, que depois da manhã de trabalho no campo, ao sábado, logo se enfiavam da taberna.
Entre os dois conflitos das guerras mundiais do séc. XX, na década de 30, havia poucas tabernas na terra, que se podiam contar pelos dedos de uma mão.
Era um hábito que vinha de gerações, nos jornaleiros que trabalhavam a terra, no campo de Salvaterra de Magos, e que se notava também no homem dos ofícios, dentro da vila
O João da Pança, a Anunciada, o Zé Luís das Neves, o Vitorino Marreco, e o Artur Xavier, abriam portas aos primeiros sinais da manhã, enquanto o homem rural saia de casa uma ou duas horas antes do sol nascer (o seu relógio era o cantar dos galos), bebiam o café, muitas vezes feito de cevada/ou chícharo torrado e moído, com um naco de pão barrado de toucinho cozido, que tinha sobrado da ceia.
Muitos deles não deixavam de “matar o bicho” naquelas tabernas, bebendo um copo de aguardente, enquanto o homem urbano só pelas 7 horas começava a movimentar-se nas ruas, e bebia a sua ginja ou abafado. No campo, a hora do almoço era aí pelas 10 horas da manhã, e o jantar comia-se por volta das 3 ou 4 horas da tarde. A comida era levada numa pequena caldeira, e aquecida em grupo num brasido de lume. A despega era sempre já depois do sol posto, havendo trabalhadores, cansados na cava da terra com enxada de lamina larga, não deixavam de olhar de esguelha a luz fusco na serra de Sintra!
- Alguns ranchos de mulheres e moças, juntavam-se na estrada da Ponte de Pedra, a pé em passo estugado, entravam em caminhos de terra, do Malagueiro, com os campos dos freires à vista, já perto do Vau. Aqueles que tinha a jorna nas Courelas junto ao Tejo, era na pequena taberna da família de Artur Pinto, que mal dava para meia dúzia de pessoas em pé, para o seu ultimo "mata-bicho", e não deixavam de trocava a saudação de “um Santo Dia” com os Pescadores e Marítimos, que por lá já andavam na faina do cais.
- De regresso a casa, alguns depois da hora da ceia, ainda davam um salto à taberna do João da Pança, (homem mediano de altura, usava além do um cinto uns suspensórios de tiras de cabedal , por cima do colete para segurar as calças, pois tinha a barriga dilatada - talvez daí a alcunha!), arranjavam parceiros e jogavam uma cartada à bisca, para beberem uns copos de vinho.
Alguns esqueciam-se do tempo, e ao entrarem à porta de casa, já com a cabeça a toldar – lá ouviam da mulher um ralhete: - És sempre a mesma coisa!... Já vens com o bandulho cheio, e eu, sem dinheiro para comprar comida prós rapazes comerem.
A Taberna do João da Pança, tinha à porta um assento em cimento, do lado da rua da Azinhaga (rua Porfírio Neves da Silva), mesmo em frente à rua dos Quartos, dava jeito nos dias de verão, para estarem à conversa contando umas anedotas.
A Anunciada, tinha porta da sua taberna aberta a meio da azinhaga estreita do Arneiro, e lá se viam misturados, gente rural com os dos ofícios que, se entretinham a jogar o chinquilho, noite dentro à luz do gasómetro(1). O José das Neves, estabelecido na esquina da Trav. do Martins, com a rua Direita, esteve poucos anos de porta aberta, mas tinha uma clientela especial, servia de tertúlia onde se discutia os toureiros e cavaleiros, em fama nos cartazes das arenas de Portugal e na vizinha Espanha.
Foi ali, que em 1919, saiu a ideia da construção da Praça de toiros de Salvaterra de Magos.
*José Gameiro
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Nota: (1) Esta taberna, foi descrita no Conto o ”Último Dia do Lobo em Salvaterra”, de José Amaro - década de 30, séc. XX
Foto: do Autor @ Casa antiga Taberna do João da Pança
QUANDO O PEPINO, ERA COMIDO COM SAL, NAS TABERNAS DE FOROS DE SALVATERRA,e servia de petisco acompanhando uns copos de vinho.
A alimentação do povo rural, de Salvaterra de Magos, nos anos entre as duas guerras mundiaisaté à década de 40 do séc. XX, além de parca não era muito diversificada.
Nesse tempo os lavradores das casas agrícolas da vila, tinham o privilegio de ter as suas hortas – A família Roberto, tinha uma nos terrenos da “Amieira”, ao lado a Família Roquette, aproveitava a nascente de água, na “Peteja”, enquanto a família Costa Freire, usava as terras das “Gatinheiras” , e todo o ano tinham à mesa vegetais e hortaliças, enquanto as alfaces e os pepinos não faltavam nas saladas a acompanhar o peixe e a carne.
Houve na vila, uma grande Horta, aberta em terreno publico, em frente à Praça de Toiros, para dar de comer ao povo, após o terramoto de 1909, era seu hortelão, um tal António Sopas.
No dobrar do século, estava fechada e ao abandono, a pesar de estar murada!Neste tempo, muitos rurais, tinham a sua “Boiça/ou Calhandra”, em terra arrendada lá para os lados da margem do Tejo, onde faziam as suas pequenas hortas.
Dando à imaginação, as receitas dos seus antepassados, também lá cultivavam o tomate e o pepino e beringelas (depois de assados na brasa) e bem temperados em sal, acompanhavam uns bons copos de vinho.
A roda da alimentação não era conhecida, nas sopas, entre as verduras, a couve galega era a preferida, dava para se “ripar as folhas”, todo o ano. Naquele tempo, usava-se o chícharo, uma leguminosa mal vista na mesa dos ricos, pois era usada em grandes sementeiras dos lavradores, para alimentarem as manadas de gado. Sendo muito parecido, com o tremoço e o grão-de bico, naquele tempo de fome, o povo torrava-os (nos forno dos padeiros) e enganava a barriga bebendo o líquido à hora do café.
O Chicharro era também um “acepipe” das gentes rurais cá da terra. Usado bem cozido, era comido com migas e bacalhau assado, em alguns domingos e feriados do ano.
Esta e outras comidas que, vinham de séculos, cairam em desuso, mas estavam conservados, pelo povo Foreiro, que um dia desbravaram aquela vasta terra, que foi da Coutada real de Salvaterra, pois tinham-nos levado da sua da terra-mãe.
Por volta de 1950, no terreno do Estanqueiro, pelo meio da tarde, o Poço de Água, ali construído em 1936, tinha à sua volta muitas mulheres e moças, - era Domingo, estavam na Praça da Jorna! – aguardavam a fala de trabalho, e entretinham-se a comer algumas pevides e tremoços, que a Custódia Pulga, vendia à sombra do grande eucalipto. A seu lado, um membro de uma grande irmandade; o José Maria Bolieiro, vendia Pepinos – era época deles, depressa os homens, enchiam a taberna da Maria do Carmo Duarte, e lá iam descascando-os ao alto, com a pequena navalha, e abertos em 4 partes temperados com sal, acompanhavam um copo de vinho. - eram um bom petisco!
*José Gameiro
Foto@do autor
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