Terça-feira, 2 de Outubro de 2007

RECORDAÇÕES NA PRAIA DOS TESOS (AGORA PRAIA DOCE)

 As cheias de Inverno, todos os anos faziam mudar o local das areias junto àquela propriedade do “Minhoto”, fazendo aparecer uma bonita praia de extenso arial.

Daí em diante, foi aquele arial usado pelo povo de Salvaterra e, passou a ser conhecido pela Praia  dos Tesos – pois os mais abastados da vila, iam de abalada todos os anos até à Nazaré, ou Figueira da Foz, ou mesmo para as Termas.

 

                        UIM DIA PASSADO NA PRAIA DOS TESOS

Rapaz que eu era na altura, num daqueles dias de Domingo, dei comigo no sossego da frescura das sombras e, da água que corria de mansinho a registar a minha nova experiência – estava na praia.

Alguns para além dos “farnéis”, traziam apetrechos da pesca (cana, bornal e saca-peixe), afim de se dedicarem ao seu desporto, pois no local a fataça abundava em quantidade.  Muito perto, a escassos metros, algum gado movimentava-se para junto de um pequeno regato, que se aninhava nas areias, afim de se sedentarem de uma noite passada ao relento.  Uns atrás dos outros, como em fila indiana, começaram a chegar mais banhistas com seus amigos e familiares.e, num ápice, toda a zona conhecida pela “Praia dos Tesos”, estava cheia de vozes humanas, que punham em desassossego a pardalada que, mal tinha acordado.

Nas primeiras horas alguns adultos aproveitavam para fazer uma colheita de pequenos paus e canas, que o rio nas suas marés depositava mesmo ali à mão, a fim de começarem a fazer lume para as suas refeições que seria de frango assado, ou de pequenas fatias de carne  entremeada de porco assado na brasa(1). Agumas crianças pelas mãos dos seus vigilantes, iam para as areis brilhantes do rio, onde a maré já começava a movimentar-se, a fim de aprenderem a prática  da natação, no entanto  os mais tímidos choravam  em altos gritos, não só pela água fria, como também pelos grandes  “tufões” que a rapaziada maior fazia com as suas brincadeiras.

 Quase todos os presentes, que no local se encontravam, escolhiam a hora do almoço entre a uma e as duas da tarde. Assim ao som da música de uma pequena telefonia e das anedotas, entre umas goladas do bom vinho dos campos da terra, a camaradagem era excelente e já ninguém se lembrava da semana que findou.  Pela tarde dentro. uns dormem a sesta em cima de um cobertor, outros brincam no areial da praia com jogos de bola; outros ainda vão continuar na pesca, enquanto algumas moças estão estendidas nas toalhas, afim de bronzearem a pele num corpo a despontar para a vida.  Quando o dia começou a chegar ao fim, o habiente até aí calmo debaixo, das aprazíveis árvores, entrou num reboliço total - os motores das motorizadas e dos carros começaram a movimentarem-se para o regresso a  casa.

Muitos nem têm tempo de apreciar o grande bando de milharós, que mostravam o seu bonito colorido das penas e a melodia do seu cantar que,  agora  ao cair da tarde, vão  entrando e saindo dos ninhos  feitos numa barreira  do “Mouchão da Quinta da Saudade”. Em pouco tempo, o local ficou deserto, na espera que  no próximo Domingo, as areias da "Praia dos Tesos", voltam a ser local de encontro.

 

 

 *************

*   Texto publicado em 1976 – Jornal “Aurora do Ribatejo” e no Jornal Vale do Tejo – 2000 (1) - Petisco, que mais tarde ganhou fama, em dias festivos, com o nome "Saldinhas de Salvaterra"

 

                                      UM AVIÃO NA PRAIA DOS TESOS

 

Estavamos em 1956, naquele dia disputava-se um jogo de bola (de borracha) entre os rapazes da vala e os das areias, o empedrado do cais da vala servia de campo, depois das aulas da escola, com jogos, ora; com os rapazes das barracas e do bairro novo (junto à Casa do Povo), ora; com o da falcoaria, do Lopes e dos quartos.  Muitos jogavam descalços, pois o calçado eram coisa preciosa. Naquela tarde de verão, quando o jogo estava a decorrer, uma avioneta de quatro asas, começou a voltear sobre os jovens jogadores, acabando por fim por se afastar lá para os lados do Tejo.  Uns tempos depois, apareceram  em cima da ponte da vala real, dois homens vestidos com fato de macaco, um capacete de cabedal fino na cabeça, mas desapertado no queixo, uns óculos vinham abertos em cima da cabeça, por cima do capacete. Era gente de um outro mundo!!!   Deixámos o jogo e, fomos ao seu encontro, queriam encontar um telefone.  Encaminhados à taberna do Camilo Martinez (galego, fugido da guerra civil de Espanha), mesmo ali junto à Capela da Misericórdia, lá trataram dos seus contactos.   De regresso, ao pequeno avião, um dos seus tripulantes, já nas areias, após a descida da estrada que dá acesso ao Escaroupim, ali junto às pequenas boiças (hortas), começou a encontrar no chão junto a pequenas ervas altas, ninhos de calandra.   Com voz meiga, dizia ao magote de rapazes que os seguiam; cuidado que com os ninhos, não lhes mexam!

Enquanto esperávamos, os aviadores lá iam perguntando em que classe andávamos na escola e, porque é que alguns andavam descalços. Um pouco depois, juntaram-se a nós, uma fila indiana, que não mais parava de crescer; uns vinham a pé, outros de bicicleta. Umas boas duas horas depois, um jeep aparerceu no cima da estrada (tapadão), os dois pilotos lá começaram a acenar as mãos. O carro, parou junto às árvores, pois o avião tinha "pousado"  no areal da praia dos tesos.   Os dois mecãnicos, vindos de Arverca, retiram uma grande caixa de madeira e, após informação dos aviadores onde era a avaria,  lá começaram a reparar o motor do pequeno avião. 

A tarde já ia alto, refrescava ali junto às águas do rio, quando vejo meu pai, que me procurava entre a multidão e, me chamou dizendo: "Olha lá, por causa do avião esqueceste-te de ir buscar o petróleo à loja, a tua mãe, quer fazer a ceia, pois chegamos agora do trabalho"

Nem olhou para a multidão, tão zangado estava, amarrou-me à cintura, uma corda que tinha na bicicleta e, lá veio pedalando entre as pessoas que ainda iam ver o avião, vindo eu a correr atrás da bicicleta até chegar ao Botaréu da Capela, onde morávamos. Grande castigo foi aquele, para grandes males grandes remédios. O recado foi feito, na loja do António Henriques, junto à torre da Igreja, fui num pé e vim noutro.

Nunca mais em casa  se falou no assunto!

 

 JOSÉ GAMEIRO

 

publicado por historiadesalvaterra às 11:13
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1 comentário:
De Andreiazinha a 25 de Novembro de 2007 às 20:41
Olá!
Está muito bom este blog!~
Parabens


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