Segunda-feira, 1 de Setembro de 2008

A MARRETA QUE DESTRUIU O MURO DO JARDIM

   Quando criança aprendeu a trabalhar a terra, como trabalhador braçal, as cearas de sequeiro eram as mais usadas na época.    Não quis aprender a arte da campinagem e endireitar a espinhela(1), mesmo tendo em casa um professor, seu pai que chegou a campino-mor.  Nasceu, em plena primeira guerra mundial, foi o primeiro de uma prole de oito filhos. Os anos que se seguiram não foram fáceis, havia grandes dificuldades, a fome grassava, especialmente na comunidade rural.   A mãe por exemplo, quando do seu segundo filho, que por acaso foi a única menina que teve, vendia uma “mamada” de leite todos os dias, para aleitar um outro bébé vizinho, recebendo de recompensa 2 tostões.

    Ainda jovem, foi experimentar os trabalhos na construção civil, esteve na estrada nacional 118, foi de abalada até às obras do estádio nacional, no Jamor.  O espaço desta grandiosa obra, ocupava uma zona de pedreira, que era rebentada a explosivos.      

       Vários empreiteiros, davam trabalho a milhares de trabalhadores que recebiam semanalmente da ferramentaria, a peça de trabalho.  A ele, calhou-lhe uma marreta para partir pedra depois das explosões. O tempo ia passando, o cinema recrutava entre eles  muitos figurarntes para cenas do filme “A  Aldeia da Roupa Branca”.  A que mais se lembrava e contava com entusiasmo: uma  simulação de rixa à paulada, numa feira de Caneças, caiu num cesto de verga com ovos e quando se levantou muitos pintos fugiram, valeu-lhe mais alguns cobres, dizia.  Com a inauguração do estádio, no dia 10 de Junho de 1944, tinha eu, dois meses de idade, regressou de vez a casa, a pequena marreta de ferro, acompanhou-o como recordação.

   Cansado de tanto andarilhar, teve na câmara municipal de Salvaterra de Magos, sua terra-natal, um trabalho na limpeza do lixo, nas ruas da vila, função que acumulava com a de ajudante de canalizador.  Enfim, por haver só meia dúzia de funcionários, fez de tudo um pouco; distribuiu carnes, pavimentou estradas a alcatrão, foi calceteiro e por fim jardineiro. 

  Em 1956, com a decisão municipal de dar novo visual ao antigo jardim público, na praça da república, ele e um outro colega de nome André, foram incumbidos de deitarem abaixo todo o muramento.  Numa semana à força de trabalho braçal, meu pai, José Gameiro Cantante, usando a marreta, que tantos calos já lhe fizera, fez desaparecer uma obra que vinha do final do séc. XIX.  A marreta, seu precioso instrumento de trabalho, é agora uma relíquia, está na posse de um dos seus três filhos.

 

**********

(1)     – Endireitar a espinhela: Os campinos por vezes faziam este trabalho quando os vitelos nasciam, e o parto acontecia com as vacas em pé, os pequenos animais ao baterem no chão, ficavam com a coluna torta.  

Nota: a Marreta, tem outra história: Era nova quando, foi distribuída ao José Gameiro Cantante, na construção do Estádio Nacional (Lisboa)  

 

 

JOSÉ GAMEIRO

 

     

publicado por historiadesalvaterra às 18:11
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